sábado, 28 de março de 2015

Um contraponto à teologia sádica

Ricardo Gondim

Os horrores de um campo de exilados das Nações Unidas no Sudão passam desapercebidos porque parecem distantes. A sorte de meninas vendidas ao tráfico internacional de prostituição soa como ficção. A falta de perspectiva dos palestinos desempregados na faixa de Gaza não sensibiliza cristãos. Por que se preocupar se a grande maioria é muçulmana?

Existem maneiras de se proteger da dor? Qual o limite para o sofrimento? Há como comparar o lamento de uma mãe que perdeu a filha com qualquer outro pranto? Para Simone Weil, o sofrimento que atinge níveis próximos do desespero, chama-se infortúnio. Para a filósofa francesa, o infortúnio acontece quando a dor chega, ao mesmo tempo, nas três dimensões essenciais da vida: a física, a psicológica e a social.
A dor física, provocada por um dente infeccionado, por exemplo, desaparece, instantaneamente, logo que o dente é extraído. Dores isoladas não deixam vestígios.

A teóloga alemã, Dorothee Sölle, afirma que nem mesmo a dor puramente psíquica alcança a dimensão do infortúnio. Para ela, o espírito que por natureza foge do infortúnio com a mesma imediatidade e o mesmo ímpeto irresistível com que um animal foge da morte, sempre dispõe de suficientes meios de derivação. Isto é, sempre há como encontrar algum suspiro para o sofrimento insuportável – até o suicídio.

Existem pessoas que sofrem o infortúnio porque são atingidas, simultaneamente, no plano físico, mental e social; encontram-se abatidas porque, junto com a dor corporal, esvai-se também a auto-estima e junto com a baixa estima brotam sentimentos (reais ou imaginários, não importa) de “descenso social”, que solapam a esperança.

O que os religiosos chamam de inferno é o mesmo que a filosofia de Simone Weil trata como infortúnio: a soma do pavor de se sentir proscrito da comunidade, mais o horror de ver-se como estrangeiro em sua própria cidade, mais as sequelas da dor física, mais a culpa sem conserto, mais a impotência diante dos processos da opressão.

A principal característica do infortúnio é a escravidão, o desenraizamento da vida, algo que, numa forma mais ou menos atenuada, equipara-se a uma morte. Esse algo presente na alma de forma inelutável chega como agressão ou ameaça direta da dor corporal. Os torturados entendem bem esse desenraizamento.
Uma mulher espancada pelo marido, e que convive em ambiente religioso e social que não permite o divórcio, sofre para além da dor.

Essa mulher se vê escravizada a um “infortúnio” sem fim. Ela vive um inferno. O mesmo inferno do índio tuberculoso quando tosse sangue e é segregado do restante da tribo; ou do iraquiano que depois de enterrar o filho, precisa voltar aos escombros de uma casa escura; ou do camponês que trabalha na lavoura da cana até morrer.
Muito do que já se escreveu como teologia, não passa do esforço de responder ou lidar com o infortúnio. Para Dorothee Sölle, as várias tentativas de responder aos horrores do sofrimento acabaram produzindo, simultaneamente,  “masoquismo religioso” e “teologia sádica”.

“Masoquismo religioso” deve ser compreendido como o esforço da teologia de oferecer argumentos que acalmem as pessoas em seus infortúnios. E um desses argumentos vem como chamada para que se encare a dor como pedagogia.
No masoquismo religioso as pessoas são ensinadas a conviverem com um Deus que abate, traz sofrimento, permite agonias atrozes, sempre para ensinar alguma coisa. Deus investe no crescimento dos seres humanos e um de seus métodos é a dor.

Então, o objetivo de uma verdadeira espiritualidade, nesse conceito masoquista, seria a aceitação ou resignação aos planos (nem sempre explicitados) de Deus para a vida. Sölle menciona em seu livro, “Sofrimento” (Editora Vozes), os argumentos de um pequeno dicionário teológico sobre a responsabilidade do homem [e da mulher] diante do sofrimento:

Aceitar sem restrições a situação que se abate sobre ele, acolhe-la e integrá-la criativamente e transforma-la (ativo enquanto sofre e sofrendo ativamente) num momento de sua realização própria (o que ver a ser o o posto de um passivo deixar-acontecer), de modo que nele se decida por Deus… Nesse sentido o sofrimento se configura como ‘querido por Deus.

A frase de C. S. Lewis, repetida sem critérios por muitos evangélicos, expressa bem a essência da espiritualidade masoquista: Deus sussurra aos nossos ouvidos por meio de nosso prazer, fala-nos mediante nossa consciência, mas clama em alta voz por intermédio de nossa dor. A dor é seu megafone para despertar o homem surdo. Para Sölle, o masoquismo religioso ensina que o sofrimento está aí para que seja quebrado o nosso orgulho, evidenciada a nossa dependência. Assim entendido, o sofrimento teria como efeito reconduzir-nos a um Deus cuja excelsitude se manifesta na medida de nossa pequenez.
Infelizmente tal masoquismo prevalece na cristandade ocidental. 

Seu propósito aparentemente nobre é convencer as pessoas de que os infortúnios incontornáveis da existência fazem parte de um plano maior, são elos ou engrenagens de um sistema que visa nosso bem eterno. Assim sendo todo sofrimento é considerado uma provação por Deus enviada, a que devemos submeter-nos.

Quem aprender a se resignar diante das adversidades mais implacáveis, consegue, dentro dessa maneira de pensar, maior consagração. Como o sofrimento significa também punição, as tribulação devem ser compreendidas como castigo divino, consequência de pecados antigos, inclusive, do pecado original, cometido por Adão e Eva.

Tal masoquismo tenta, portanto, responder aos infortúnios quando insiste que Deus faz adoecer porque ama. Se ele mata é porque precisa cumprir algum propósito (sem precisar dar satisfações a ninguém). Nesse pressuposto, afirmou-se que Deus chegou a criar homens [e mulheres] maus para usá-los também em trabalhos sujos - calvinistas argumentam com o endurecimento do coração de Faraó e a doutrina da dupla predestinação, em que uns foram criados para o céu e outros para o inferno, para provar que Deus usa a maldade para cumprir seu propósito.

Essa noção leva a outro extremo: o sadismo teológico. Diante das ambiguidades humanas, diante do recrudescimento constante do mal, não é difícil ensinar que todos devem se submeter a uma suposta pedagogia divina. Ora, o mal não desaparece, não dá tréguas. O caminho aparentemente mais fácil de lidar com as dores universais seria, então, aprender a confiar que, de alguma maneira, o sofrimento sirva para algum propósito – mesmo desconhecido e cruel.
Para substanciar esse aprendizado torna-se necessário conceber um Deus como agente causal do sofrimento:

O Deus propiciador e agente causal do sofrimento converte-se em tema transfigurado da teologia, a qual incapaz de um ardor próprio, dirige o olhar para o Deus atormentador e exigente do impossível. Mal se pode duvidar de que a Reforma tenha reforçado os acentos sádicos da teologia. A experiência existencial assim como fora configurada na mística de  um Deus que se posiciona ao lado dos sofredores é substituída por uma sistemática teologia relacionada com o juízo final.

Por isso, quando confrontado com situações paradoxais como a prosperidade dos ímpios e os infortúnios dos fiéis, Calvino ofereceu uma resposta no mínimo esquisita: O Senhor engorda os porcos para o abate.A concepção calvinista do sofrimento tenta preservar a sagrada majestade de Deus às custas da desvalorização da humanidade. Homens e mulheres são caídos e tão monstruosos que a ira divina é justificada.

Para defender essa percepção, epidemias, guerras e outras angústias são aceitas como castigos. O sofrimento vinga a glória divina, pune os pecados e educa os salvos. O sofrimento seria, assim, um castigo de Deus, mas para cumprir seu propósito. Calvino afirmou: Os povos que vens castigar; os homens foram golpeados por tuas varas através da doença, da prisão e da pobreza, devem ter pecado.

A teologia deve procurar esvaziar, precisamente, tais concepções. Deus não justifica a miséria. Os profetas clamaram – e sofreram –  que a injustiça que condena bilhões à degradação sub-humana não têm nada a ver com Deus. A truculência do imperialista e escravocrata nunca fez parte do projeto criador de Deus. Deus não suja as mãos para que os dentes das engrenagens escatológicas se encaixem. Existe uma incoerência interna no argumento calvinista. Se Deus criou todas as coisas e as predestinou para que fossem da maneira que são, ele não poderia se irar contra a perversidade já que ela fez parte de seu planejamento eterno.

A dor humana é um acinte. Ele quer que todos tenham vida com abundância. O abandono do pobre será sempre um horror que move Deus a levantar profetas para mostrarem sua indignação. Chacinas e holocaustos são excrescências provocadas pela perversidade humana; e Deus jamais planejou que fossem assim. Há dores que ultrapassam infinitamente toda forma de culpa. É demasia para todos – inclusive e principalmente para Deus.

É mister que se recupere o legado místico da espiritualidade. Depois de tantos horrores, não é possível continuar com um teísmo vingador. Não é possível aceitar o deus da pedagogia escondida – que maltrata sem dizer o porquê. Nas tradições místicas, Deus não aceita, mas é compassivo com o sofrimento e com as contingências perversas da história. O clamor dos injustiçados, o sofrimento dos escravizados e as angústias dos marginalizados sobem até os seus ouvidos e provocam sua indignação. O sofrimento do mundo magoa o seu coração.

Mesmo na lógica sacrificial, se há alguma necessidade de sacrifício para que a maldade não passe impune, Deus inflige a si mesmo – o castigo que nos traz a paz estava sobre ele. Se o derramamento de sangue é imprescindível para que se satisfaça a justiça, o Senhor, tal como uma ovelha que segue para o matadouro, entrega-se pelo mundo.

Portanto, Deus não é sádico. Deus ama sem se mostrar implacável. O conceito da graça acaba com toda a lógica sacrificial. Ninguém precisa aprender a lidar com os infortúnios sentindo que foi amaldiçoado. Cristianismo e masoquismo não combinam. A esperança de encarar a história e de repensar a individualidade nascem da noção de que a divindade não se tornou inimiga. Jesus fortaleceu a dignidade de homens e mulheres sem distinguir maus e bons. Sem gerar soberba, ele reconhece a complexidade das pessoas que guardam em si tanto bondade como maldade.

O sofrimento dos mais vulneráveis nunca, jamais, em tempo algum, devem ser tratados como justiça. A lógica férrea da leia foi esvaziada em Cristo. Deus é amigo do bem e está solidário com todos os que se esforçam para reverter infortúnios.

Soli Deo Gloria
Ricardo Gondim é escritor e teólogo,  presidente  da Convenção Betesda Brasil.  

sexta-feira, 27 de março de 2015

FEMA Acelera Preparação Para uma Pandemia

A  FEMA (Agência Federal de Gerenciamento de Emergências dos EUA) está à procura de fornecedores que possam produzir depósitos de lixo de quase 40 metros, juntamente com especialistas que possam descartar resíduos bio-médicos contaminados durante uma emergência nacional.

O Request for Information (RFI) aparece no site FedBizOpps e pede "informações de fornecedores da indústria de remoção de resíduos que podem, potencialmente, fornecer serviço de depósito de lixo e/ou recolhimento de resíduos bio-médicos e serviços de remoção durante os eventos de ação emergencial dentro da área de responsabilidade dos Estados Unidos Continental (CONUS)".

A FEMA está planejando ter uma ou mais empresas contratadas, e entregar a eles o serviço como parte de um contrato por tempo indeterminado que terá inicialmente um comprimento de base de um ano, com quatro opções adicionais de 12 meses.
O RFI afirma que os contratados "deverão coletar os resíduos infecciosos (regulamentados) diariamente" e uma página anexada com um questionário pergunta aos empreiteiros se eles podem fornecer lixeiras de diferentes tamanhos e quão rapidamente eles podem fornecer.

A FEMA, sem dúvida, afirmará que isto é apenas parte dos preparativos de rotina para emergências nacionais de saúde, as quais podem ou não acontecer, embora isso não tenha impedido que algumas pessoas expressem preocupação de que a agência federal está se preparando para uma grande pandemia como a gripe aviária H7N9 que atingirá os EUA.

Um site ligou o pedido de depósitos de lixo à uma solicitação anterior da FEMA buscando 100.000 calças e camisetas "Doctor Scrubs" (para limpeza pesada) para serem entregues dentro de 48 horas a 1.000 tendas hospitalares em todo o país. Os fornecedores responderam ao pedido incomum, afirmando que eles não seriam capazes de cumprir uma tal "cenário de armageddon".

China está sofrendo atualmente um surto de vírus H7N9, que deixou dezenas de pessoas em estado grave, com várias mortes.

Fontes:
- Infowars: FEMA Accelerates Preparations For Pandemic

- Fed Biz Opps: Dumpster & Bio Medical Waste Services