João Fellet - @joaofellet
Enviado especial da BBC
Brasil a Havana
Fonte:
http://www.bbc.com/portuguese
O papa Francisco desembarcou
no sábado em Cuba para sua primeira visita ao país.
A viagem ocorre poucas
semanas após a retomada dos laços diplomáticos entre Havana e Washington, em
processo impulsionado pelo pontífice.
Além de Havana, onde neste
domingo ele celebra uma missa na Praça da Revolução, Francisco irá a Holguín e
a Santiago de Cuba. O giro se encerra na terça-feira, quando ele parte para os
Estados Unidos.
Leia também: Após
reaproximação com Cuba, conheça os 3 países que ainda não têm relações com os
EUA
A BBC Brasil listou cinco
dos principais pontos da visita do primeiro papa latino-americano à ilha
caribenha.
1. Reaproximação com os
Estados Unidos
Os governos de Cuba e dos
Estados Unidos disseram que Francisco foi crucial na reaproximação que levou à
retomada das relações diplomáticas entre os dois países.
Autor da biografia "O
Grande Reformista: Francisco e a construção de um papa radical", o
jornalista britânico Austen Ivereigh disse à BBC Brasil que o pontífice deu o
pontapé inicial no processo há pouco mais de um ano, quando enviou cartas a
Raúl Castro e Barack Obama.
Morador de Havana passa em
frente à cartaz alusivo à visita do papa; pontífice estará até terça-feira na
ilha
Papa Francisco em Cuba - Foto BBC Brasil |
Para Ivereigh, a visita
atual do papa leva o processo a outro patamar, já que ele viajará aos EUA em
seguida.
Em Cuba, Francisco deverá
ouvir apelos para que tente convencer o Congresso americano a derrubar o
embargo econômico à ilha caribenha, que continua em vigor apesar da retomada do
diálogo. Ele discursará a congressistas em Washington na quinta-feira.
Em Holguín, Francisco poderá
tratar de outro tema sensível aos dois países: a base americana de Guantánamo.
O governo cubano exige a devolução do território, ocupado pelos Estados Unidos
em 1898, após a Guerra Hispano-Americana.
Holguín é uma das cidades
cubanas mais próximas da base.
2. Presos cubanos
Um dos pontos mais sensíveis
na relação entre a Igreja Católica e Cuba é a questão dos presidiários cubanos.
Papa Francisco em Cuba - Foto BBC Brasil |
Papa Francisco e o líder
cubano, Raúl Castro, durante primeiro dia da visita do pontífice
Representantes da igreja e
de organizações de direitos humanos criticam Cuba pelas condições de suas
prisões e o tamanho de sua população carcerária.
Na semana passada, o governo
acenou ao pontífice ao indultar 3.522 pessoas encarceradas por delitos leves.
Leia também: Caçadores de
tesouros encontram US$ 4,5 milhões em moedas de ouro em galeão espanhol do
século 18
Após vários anos sob
cobrança para que divulgasse dados sobre suas prisões, o governo anunciou em
2012 que havia 57 mil detentos no país.
O número equivale a 518
presos por 100 mil habitantes, índice que supera o do Brasil (300 por 100 mil)
e só é menor do que o dos Estados Unidos (698 por 100 mil).
3. Abertura econômica
Em célebre discurso durante
a primeira viagem de um pontífice a Cuba, em 1998, o papa João Paulo 2º pediu
que Cuba se abrisse ao mundo e que o mundo se abrisse a Cuba.
Jovens na recepção ao papa
na chegada a Havana
Papa Francisco em Cuba - Foto BBC Brasil |
Segundo o teólogo Frei
Betto, a frase "foi muito importante para melhorar as relações de Cuba com
muitos países do mundo", especialmente europeus.
Espera-se que Francisco
reforce o discurso do pontífice polonês, que teve destacada atuação pelo fim do
comunismo na Europa Oriental.
Cuba tem tentado atrair
investimentos externos, mas empresários estrangeiros cobram reformas que
diminuam a burocracia e a participação do Estado nos empreendimentos.
4. Abertura política
Segundo o bispo auxiliar da
capital cubana, Juan de Dios Hernandez, Francisco tem crédito de sobra com o
governo cubano para abordar mesmo os temas mais delicados.
Papa Francisco em Cuba - Foto BBC Brasil |
Orla da capital cubana,
Havana; em discurso, papa fez menção discreta a dissidentes do regime
Um deles poderá ser a
sucessão do presidente Raúl Castro, no poder desde 2008 e que assumiu após
quase cinco décadas de governo do seu irmão Fidel.
Em discurso neste sábado ao
lado de Raúl, Francisco fez uma referência sutil a dissidentes do regime ao se
desculpar a pessoas que não encontrará na visita "por diferentes
motivos".
Acredita-se que o
presidente, hoje com 84 anos, ficará no cargo até 2018, mas um processo de
transição poderá se iniciar em abril, quando o ocorre o próximo congresso do
Partido Comunista de Cuba, também presidido por Raúl.
Analistas dizem que ele pode
deixar a presidência do partido no congresso. Um dos mais cotados para assumir
seu posto e, posteriormente, a presidência cubana, é o vice-presidente Miguel
Diáz-Canel, de 55 anos.
5. Sincretismo
"Embora sejam muito
religiosos, os cubanos não são propriamente católicos", diz o teólogo
brasileiro Frei Betto.
Ele afirma que grande parte
da população cubana se identifica com o papa e a Igreja Católica, mas pratica
uma fé com muitas influências africanas, que tem na santería sua principal
expressão.
Fieis marcham em procissão à
Virgem da Caridade, padroeira de Cuba
Antecessor de Francisco, o
papa Bento 16 (2005-2013) condenou o sincretismo. Em visita ao Brasil em 2010,
ele se disse preocupado com "tudo o que possa ofuscar o ponto mais
original da fé católica".
Para Austen Ivereigh, que
escreveu uma biografia de Francisco, o pontífice atual tem outras visões sobre
o tema.
"Acho que Francisco
sempre teve a visão de que, se essa é a fé das pessoas, devemos procurar Deus
ali."
Segundo ele, o maior desafio
em Cuba não são as crenças afrocaribenhas, mas aumentar o número de discípulos
que praticam o catolicismo de maneira mais sistemática.
"A questão é: eles
podem fazer isso antes que Cuba mude tanto? O medo da igreja é que, ao se abrir
economicamente, Cuba possa ser tomada por valores de individualismo e
consumismo antes de ter a chance de abraçar o evangelho."
Papa Francisco em Cuba - Foto BBC Brasil |
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